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Solstício I
Solstício II
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Solstício V
Solstício VI
Solstício VII
Continua...
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Hildegaard tinha levado o seu
pequeno primo às traseiras do castelo. Tinha havido ali um bonito jardim, em
tempos, onde as senhoras nobres se sentavam à brisa de verão enquanto as
crianças brincavam. Muito do jardim se tinha perdido, até Melissen regressar. Mas
Melissen não regressou àquele castelo senão depois de Elena morrer. Hildegaard
nunca tinha feito muitas perguntas, nem teria idade de as fazer, mas tudo
indicava que a rainha Elena não se separara das suas aias nos melhores termos.
Hildegaard julgava saber porquê, mas eram mais fortes as razões para não
perguntar. Afinal, tudo estava esquecido.
Melissen
tinha regressado àquele castelo vazio, e tinha recuperado algo do jardim e
plantado uma pequena horta. Hildegaard ia na esperança de encontrar qualquer
coisa com que entreter o menino, mas naquela altura do ano só havia couves. E,
felizmente, algumas flores invernais. O pequeno Eric era curioso, quase tudo o interessava.
Ajoelhado na terra, observava atentamente o caminho de uma minhoca como se nada
de mais fascinante houvesse no mundo. Hildegaard sorria e fingia que a
fascinava também. Era estranho sentir aquilo agora, quando nunca tinha feito
questão de ser mãe…
Foi o
pequeno Eric quem primeiro ergueu a cabeça. Hildegaard só o sentiu um instante
depois. A presença, atrás deles, a muitos passos de distância. Uma forma
apenas, a princípio, a forma de um homem que se tornou cada vez mais nítida. Um
jovem alto, de cabelos negros, longos pelos ombros. Timidamente, o jovem
sorria-lhes, mas não saía do seu sítio.
Hildegaard
olhou o menino, que já inspeccionava o recém-chegado sem nada nele achar
estranho. Só então acenou à figura, autorizando que se aproximasse, e o jovem
sorriu mais e caminhou até eles com o peso das passadas de um homem vivo. Fingindo-se
o mais vivo possível, por causa do menino.
– Deves
ser o tal Reid. – Hildegaard interpelou-o, cruzando os braços no peito, um tom quase
arreliado na sua voz. Mas o jovem explicou-se:
– Fui
chamado. – e calou-se, ele próprio espantado a olhar o rapazinho que já nem lhe
prestava atenção. Em vez disso, um carreiro de formigas começava a cativá-lo. –
Ele não sabe, pois não?
– Não.
Ele não distingue. – Hildegaard esclareceu. A maior parte dos fantasmas nem
fazia aquelas perguntas, desorientados entre um mundo e o outro, mas não
parecia ser o caso de Reid. Reid sabia muito bem onde estava, com quem estava,
ao que vinha. Hildegaard sentiu a tensão abandonar-lhe o corpo. A maior parte
dos fantasmas era tão maçadora. – Eu também era assim, da idade dele. Não
conseguia distinguir.
Reid continuava
a esforçar-se por parecer vivo, no sorriso, no brilho dos olhos. Hildegaard
sabia, de alguns do outro lado, que não era fácil.
– Vim,
como já deves imaginar, com uma mensagem. – o jovem confessou, quase embaraçado.
O outro lado sabia que Hildegaard não gostava muito de transmitir mensagens. –
Peço-te, porque a minha esposa sofre. Peço-te que lhe digas que eu também não
sei como morri. Bateram-me na cabeça e não tornei a acordar. Por favor diz-lhe,
por compaixão. Ela agradecer-te-á. Há tantos anos que vive na dúvida! Eu teria
vindo mais cedo, mas não nos querias receber. Compreendo, e não me voltarás a
ver.
– De
acordo. – Hildegaard acedeu. Não gostava de fazer perguntas acerca das
mensagens, seria como bisbilhotar o que não era da sua conta, mas não era difícil
perceber. Reid viera porque falavam da sua morte, e algo na sua morte ainda
atormentava a pobre Melissen. – Dir-lhe-ei, se isso a ajuda.
Sério,
grave, Reid olhou-a nos olhos. A sua aparição quase se esbatia, tal era a
intensidade das suas palavras:
–
Agradeço-te. Que mil bênçãos te acompanhem.
O menino
aproximou-se, rindo, e mostrou-lhes o que trazia na mão. Um caracol em forma de
búzio, como nunca tinha visto. Ao chegar perto de Reid olhou para cima e
procurou-lhe os olhos, quase desconfiado, quase prestes a descobrir qualquer
coisa. Hildegaard nada disse ou fez, nem quando o pequeno Eric estendeu a mão
para dar aquele presente ao desconhecido. Reid compreendeu a intenção e abriu a
mão, e Hildegaard abriu a sua por baixo da dele, e foi ela quem apanhou o caracol
quando o seu pequeno primo o pousou. O menino não percebeu, ainda tão inocente
na sua ilusão.
Vozes
chegavam do outro lado da torre. Eric e Melissen acabavam de sair.
– Diz
adeus! – Hildegaard lembrou o menino, e este acenou enquanto Reid se afastava
na direcção inversa àquela de que tinha vindo. Reid acenava também, até
desaparecer atrás da esquina ao fundo, e nada ao menino parecia estranho.
Sorrindo,
Hildegaard colocou no chão o minúsculo caracol, com todo o cuidado. Agora já
sabia o que a atraía naquela criança, mais do que sangue, mais do que instinto,
mais do que amor. Ele era como ela, e ele sabia que era como ela, e tinha-a
escolhido. E aquele não era laço que pudesse ser quebrado.
Continua...
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